Eu sempre sou a pessoa que dorme no chão (#18)
Uma metáfora idiota — ou não — sobre como eu sempre me importo com o bem-estar dos outros antes do meu
Antes de começar, uma musiquinha pra relaxar… (OBS.: não me responsabilizo por nenhuma letra que possa te afetar).
Sabe aqueles momentos em que você tá apenas fazendo alguma coisa comum e de repente chega a uma conclusão como se tivesse acabado de se dar conta de uma coisa muito óbvia durante uma sessão de terapia? Pois é, foi o que aconteceu comigo no último final de semana.
Eu fui pro aniversário de uma das minhas melhores amigas (um beijo, Analice!) e tive um final de semana incrível. Me diverti muito, conversei com praticamente todos os amigos dela e conheci todos os personagens dessa série.
O momento que me deu esse estalo, foi, obviamente, na hora de dormir. A gente tava em 5 meninas no quarto, arrumando camas, separando travesseiros, colocando lençol nas camas, etc. Tinha uma cama de casal, duas de solteiro e um colchão que ia no chão.
A gente não tinha feito aquela coisa de separar lugares e falar onde cada uma ia dormir e, na minha cabeça, eu tinha uma cama escolhida, mas em nenhum momento verbalizei isso. Quando chegou a hora de dormir, todo mundo se aconchegou e o colchão sobrou e, sendo bem sincera, fiquei um pouquinho chateada por pensar que em nenhum momento me perguntaram se tudo bem eu dormir no chão, porque, de fato, sempre esteve tudo bem dormir no chão. Nunca liguei pra isso. Eu acho que só fiquei chateada porque eu já tinha escolhido uma cama — mas fiquei chateada por que, se ninguém sabia disso?
E aí pensei “ah, tudo bem, sempre durmo no chão”. Porém, poucos minutos depois, essa frase bateu de um jeito diferente.
Não consigo lembrar de nenhum momento da minha vida em que tinha um colchão no chão e ele não foi meu. Quando as pessoas me visitam em casa, é claro que eu quero que elas tenham a melhor experiência, então eu mesma digo: a cama é de vocês, eu durmo no chão de boa!!!! Quando vou dormir na casa de alguém, falto morrer se a pessoa move mundos e fundos por mim, então sempre falo: se botar um tapete debaixo da mesa e me colocar pra dormir lá, eu durmo de boa!!!!!!
Porque é a verdade, eu durmo de boa em qualquer lugar que me colocarem, mas todo mundo gosta de conforto às vezes. Só que eu abro mão do meu conforto pra não causar desconforto em outras pessoas.
Não quero ser a que faz drama por causa de uma cama; não quero ser a que gera uma comoção porque não quer dormir no chão; não quero colocar meus convidados pra dormir no piso; não quero que ninguém tenha trabalho pra pensar se tô bem ou não. É aquela mesma história de sempre sobre ser a criança que não dava trabalho. Tudo pra mim tava ótimo, mas sempre esteve ótimo porque eu não queria fazer ninguém quebrar a cabeça pra pensar em como me agradar.
Porque acho que faz mais sentido alguém ficar bem do que eu ficar melhor. Uma troca silenciosa que nem sempre percebo que tô fazendo. Uma tentativa automática de equilibrar o ambiente, de garantir que ninguém fique desconfortável — nem que isso signifique eu me espremer no canto do tapete.
O problema disso é que, às vezes, a gente se acostuma tanto a ser a pessoa que dorme no chão que nem se pergunta mais se quer o sofá, se quer, pelo menos, se espremer entre outras pessoas numa cama queen.
E, tudo bem, confesso que entre dormir apertada e dormir no chão, eu escolho o chão.
Não tô dizendo que é ruim cuidar dos outros — eu amo, inclusive. E pode ser porque, dessa forma, eu me sinta útil. Gosto de garantir que todo mundo esteja bem. Mas tem um limite entre ser alguém que se importa e ser alguém que se apaga. Entre ceder porque você quer e ceder porque já nem sabe mais escolher.
O que acontece se eu não jogar o travesseiro no chão de primeira? Se eu checar se alguém oferece um lugar melhor, se tem um meio-termo? Talvez eu perceba que dá pra ser gentil sem precisar acordar com dor nas costas.
Ou talvez eu durma no chão de novo. Mas, pelo menos, sabendo que foi uma escolha — e não um reflexo automático de quem sempre prioriza o outro antes de si mesma.
É impossível não questionar o porquê de fazer isso comigo.
Quando é que normalizei me colocar em último lugar, como uma pessoa menos importante ou que merece qualquer coisa? Quando foi que perdi o amor por mim, mesmo que inconscientemente, ou transformei isso em algo tão normal que já nem vale mais a reflexão?
Eu sempre acho que gosto muito de mim, mas são essas pequenas agressões que me fazem perceber que talvez eu não goste tanto assim. Eu não colocaria alguém pra dormir no chão — e realmente não coloco — então por que faço isso comigo?
Parece que, em algum momento, eu aceitei a ideia de que o meu conforto pode ficar pra depois. Que minha vontade pode ser deixada de lado. Que minhas necessidades são opcionais. Mas opcionais pra quem? Quem determinou que eu deveria ser a última prioridade da minha própria vida?
Eu sei que ninguém disse isso diretamente, mas, de alguma forma, eu internalizei essa ideia. Pode ser porque aprendi a medir meu valor pelo que posso oferecer aos outros, pelo quanto consigo ser útil, agradável, disponível. Pode ser porque fui recompensada por isso, como se ser uma pessoa que se coloca em segundo plano fosse algo nobre, bonito, digno de admiração.
Mas tem um limite pra essa generosidade quando ela vem às custas de mim mesma. Eu me pergunto: até quando vou agir como se não merecesse o mesmo cuidado que ofereço? Até quando vou romantizar o papel de quem aguenta tudo, de quem sempre dá um jeito, de quem não quer incomodar?

Eu não sou um inconveniente. Eu não sou um peso. Eu não sou alguém que deve se contentar com sobras — seja de atenção, de carinho ou até de um lugar confortável pra descansar.
E se, a partir de agora, eu começasse a me tratar com a mesma consideração que dou aos outros? E se eu decidisse que mereço o que há de melhor, sem precisar justificar, sem precisar provar nada?
A linha entre se priorizar e ser tachada como egoísta é muito tênue. Ou, na verdade, ela até seja a mesma linha, já que alguém que se dá valor sempre vai ser visto como egoísta, simplesmente porque parou de fazer as vontades alheias pra fazer as próprias vontades.
Mas eu começo a me perguntar se vale a pena carregar esse peso de aprovação. Se realmente quero continuar sendo alguém que agrada a todos, enquanto me desagrado o tempo inteiro. Se o custo de ser querida por todo mundo não tem sido, no fim, o meu próprio bem-estar.
Porque, por mais que tentem me convencer do contrário, eu sei que me escolher não é um ato de egoísmo. Não é errado querer o melhor pra mim; não é errado colocar limites; não é errado decidir que a minha paz vale mais do que a aceitação de quem só gosta de mim quando eu sou conveniente.
E aí gera um debate: será que não gostam de mim só por toda essa disponibilidade que ofereço?
Assunto pra outro texto.
Na próxima edição (ai que chique falar assim!):
Me identifiquei mais do que gostaria.
Minha psicanalista vai saber seu nome.
Quase chorei, apaga