Quanto mais velha você fica, menos você chora (#16)
Talvez as lágrimas percam a frequência com o tempo.
Antes de começar, uma musiquinha pra relaxar… (OBS.: não me responsabilizo por nenhuma letra que possa te afetar).
Dessa vez, eu me responsabilizo pela letra da música, sim. Porque foi ela que me fez ter a ideia pra escrever esse texto.
Eu gostaria de não ter me entregado tudo
Eu pegaria de volta as coisas que gostaria de não ter dito
Está ficando mais difícil com o passar dos dias
Quanto mais você envelhece, menos você chora
E eu não sei o que tenho que mudar
Não importa o que eu faça, sempre termina da mesma forma
E eu não estou desistindo ainda
Mas eu não tenho muito sobrando
Talvez você já tenha passado — ou visto alguém passar — por aquele momento de birra na infância que a mãe fala: “Se não parar de chorar, eu vou te dar motivo pra chorar de verdade”. Cruel? Provavelmente, sim. Mas funcionava.
Eu era a criança que não dava trabalho, então eu vi essa frase sendo dita pros meus irmãos mais novos muitas vezes, já que eles foram os capetinhas que eu não fui.
Pensando sobre ela, percebo que a vida nos dá muitos motivos pra chorar. É o trabalho que você é obrigada a ir porque não achou algo melhor ou na sua área; a falta de companhia pra fazer coisas simples; a falta de dinheiro pra comprar alguma coisa legal; e diversas outras coisas que parecem sempre faltar.
Porém, também percebo que, quanto mais velha fico, mais conformada fico. Eu já entendi que o mercado de trabalho é uma porcaria e que o sobrinho do dono sempre vai se destacar mais, mesmo que eu tenha graduação, pós-graduação e quase 10 anos de experiência. Também sei que meus amigos estão cada vez saindo menos ou se importando menos em estar presentes. Eles já estão construindo suas famílias, seguindo suas vidas, e preenchendo um espaço que antes era da amizade com outras coisas mais “relevantes”. Entendi também que nunca vou ser rica. Posso melhorar de vida, parar de precisar me importar tanto com cada moedinha que entra na minha conta, mas nunca vou poder esbanjar.
Recentemente, também me conformei de que o amor pode não ser pra mim, mesmo que eu me recuse a deixar de acreditar nele. Antes, eu via um vídeo de algum casal no TikTok e ficava genuinamente MUITO triste pensando que eu nunca ia ter aquilo. Agora, fico feliz de saber que existem pessoas que têm a oportunidade de experienciar um sentimento tão lindo assim.
Me conformei sobre as coisas não darem tão certo na minha vida, sobre sempre ter um pepino pra resolver e sobre sempre precisar ser forte pra passar por cada coisa. Sempre dizem que me admiram, que gostam muito da forma que eu lido com as coisas e de como sempre resolvo tudo. Mas alguma vez já pararam pra pensar que eu não tenho outra alternativa?
Não é que eu goste de resolver, eu preciso. Eu preciso ser forte, eu preciso ter um emprego pra pagar minhas contas, eu preciso engolir sapo pra não ser demitida, eu preciso abdicar do meu tempo pra trabalhar com outras coisas pra ter mais dinheiro. Eu preciso ser forte pra não desabar, porque não tem ninguém pra me segurar. E se eu desabar, eu mesma preciso levantar do chão e fazer meus curativos.
Moro longe dos meus pais, minha base mais sólida de amigos também tá longe de mim. Sou literalmente eu e meus gatos contra o mundo, e agora, um deles ainda tá internado bem doentinho — inclusive, isso me arrancou uma paulada de grana que eu tinha guardada pra não passar apuro. Talvez eu tenha que autorizar a eutanásia dele, porque não acho justo que ele continue no mundo sofrendo por puro egoísmo meu. Não quero manter ele vivo só por apego. Falei isso pra alguns amigos e me disseram: “Nossa, não sei como você fala isso com tanta tranquilidade, eu estaria desesperada”. É, e eu tô. Eu já chorei tanto que entrei naquele estado de torpor, onde não consigo derramar mais nenhuma lágrima, porque elas não vão fazer meu gato se curar magicamente.
E é por isso que eu acredito mesmo que quanto mais velha você fica, menos você chora. A vida já foi tão cruel com você, já aconteceu tanta merda, que nada mais te deixa abalada o suficiente. É como se o tempo tivesse um acordo comigo: aguenta firme e, em troca, eu te deixo mais resistente. Como se cada aniversário fosse uma camada extra de blindagem emocional, tornando as coisas menos cortantes, menos urgentes, menos dignas de lágrimas.
Não sei exatamente quando percebi que essa teoria tava certa, mas de um jeito bem diferente do que eu imaginava. Eu achava que chorar menos significava sentir menos, mas, na verdade, significa sentir de outro jeito. Os dramas do cotidiano perdem um pouco do peso, as dores previsíveis já não pegam tão de surpresa, e o coração aprende a se refazer sem precisar transbordar tanto. Não é que a vida deixe de doer, mas a gente aprende que algumas dores não valem o show completo, só um suspiro e um silêncio.
Chorar menos não é ficar insensível. É entender que certas coisas vão acontecer, que nem tudo merece a nossa ruína e que o que parecia insuportável ontem pode ser só um detalhe amanhã. É perceber que a vida continua depois de um coração partido, depois de uma decepção, depois de um dia ruim. E que algumas coisas, de tão pequenas, já nem merecem o luxo das nossas lágrimas.
Mas tem outra parte desse processo: quando a gente chora, o choro é diferente. Mais raro, mas mais profundo. Não é pelo tropeço no meio da rua, nem pela mensagem visualizada e ignorada. É por coisas maiores, mais significativas. O choro se torna um ritual, quase uma despedida do que ficou grande demais pra ficar guardado. Ele vem por amor, por perda, por beleza, por uma memória que bateu do nada.
Então, sim, quanto mais velha eu fico, menos eu choro. Mas quando choro, sei que é por algo que realmente importa.
E se não importar, a gente ri pra não chorar.
percebi isso a uns tempos, mesmo sendo nova coisas que me destruiriam antes hoje apenas são um incômodo. Existem coisas que a minha vontade ainda é de falar e expressar a minha indignação com algo mas eu apenas respiro e falo "e eu vou endoidar é?" e deixo pra lá
só o título já me fez dizer “meu deus, verdade”