Quem é que vai me ajudar a ser o que eu quero? (#27)
Tem dias que eu só queria não ter que decidir nada
Antes de começar, uma musiquinha pra relaxar… (OBS.: não me responsabilizo por nenhuma letra que possa te afetar).
Tem dias que eu sei muito bem quem sou.
Sei das coisas que eu gosto, dos filmes que amo e dos livros que detestei. Consigo facilmente ranquear meus personagens literários favoritos, as músicas que mais me marcaram na vida e quem são as pessoas que sempre estiveram comigo, independentemente de qualquer coisa.
Tem dias que reconheço meu valor, que sei de onde vim e que conquistei tudo que tenho por total mérito meu. Sei que sempre fui independente e fiz questão de resolver tudo sozinha.
Mas é aí que entra o paradoxo: e se eu simplesmente tiver cansado de resolver tudo sozinha?
Lembro perfeitamente de quando eu assisti Fleabag pela primeira vez — até porque nem faz tanto tempo assim — e eu sempre ficava chocada em como ela não tinha controle da vida dela. Também lembro de quando li um texto aqui que citava uma fala muito específica dela:
“Quero alguém que me diga o que vestir todas as manhãs. Quero alguém que me diga o que comer. O que gostar, o que odiar, o que me deixar furioso, o que ouvir, qual banda gostar, para onde comprar ingressos, sobre o que brincar, sobre o que não brincar. Quero alguém que me diga em que acreditar, em quem votar, quem amar e como dizer a essas pessoas. Só acho que quero alguém que me diga como viver a minha vida, Pai, porque até agora acho que tenho entendido errado.”
Isso me chocou muito, porque também lembro de pensar: caramba, imagine não ter nenhuma autonomia, não conseguir decidir algo que você quer ou o que você gosta.
Agora, não sei bem pelo que tô passando, mas me vejo nessa situação de querer que alguém decida tudo por mim, porque não sei se sei bem o que tô fazendo.
Tem dias que eu não sei nem por onde começar. Ser quem eu sou parece um labirinto construído por mãos que não foram minhas. E se eu tiver me afastado tanto de mim, tentando caber em lugares que nunca foram meus?
E se não fosse pra eu ser uma pessoa tão independente assim?
E se eu não me esforçasse tanto pra sempre parecer tão inabalável?
E se eu tivesse deixado que cuidassem de mim sem tentar mostrar pro mundo que dou conta de carregar ele nas costas?
Por que, é claro que as pessoas se acostumam com isso. Talvez ninguém ajude justamente porque sabem que, de alguma forma, eu vou conseguir dar conta daquilo. Mas e se eu não der conta em algum momento, quem é que vai me socorrer?
Não sei se quero saber da resposta.
Às vezes, eu queria alguém que olhasse pra mim e dissesse: “Eu sei. É difícil. Mas você não precisa fazer isso sozinha”. Tem cansaços que não cabem num desabafo e tem dores que nem a gente sabe nomear. E tem um vazio que só preenche quando a gente se sente visto, mesmo sem dizer nada.
É claro que é muito simples pensar “ué, simplesmente comece a pedir ajuda”, mas não é bem assim que funciona. Essa ferida vem de antes, desde que eu era pequenininha. Aquela história da filha que não dava trabalho, sabe? Eu sou a pessoa que não gosta de pensar que posso estar incomodando alguém de alguma forma, então eu faço o possível e o impossível pra facilitar a vida do outro.
Me acostumei a ajeitar tudo ao redor, sendo que meus próprios pedaços estão espalhados por aí, talvez gritando pra que eu dê um pouquinho de atenção a eles, que não me passe pra trás pra ajudar os outros, sendo que eu também preciso de ajuda. É aquela coisa de precisar estar bem pra deixar alguém bem — só que eu não penso assim. O processo acontece de fora pra dentro: me sinto bem quando sei que deixei alguém bem.
Lendo isso, você pode até pensar algo tipo então me fala o que você precisa que eu te ajudo!
E é aí que tá.
Eu não sei o que preciso.
Só sei que cansa viver no mudo. Quem aprendeu a se calar, a se adaptar, a se apagar pra não incomodar, vai acumulando um silêncio que uma hora começa a doer. E não é só cansaço físico, é um desgaste emocional de existir sempre pela metade, com alguma coisinha faltando.
Quando a gente se acostuma a ser solução, é difícil reconhecer quando precisa ser acolhida.
Talvez eu só esteja esperando alguém sentar ao meu lado e segurar minha mão, sem querer me consertar; sem pressa; sem perguntas.
Só ficando, existindo junto.
E ajudando, devagar, a lembrar quem eu era antes de me esquecer.
texto incrível!!!!!!!!!
a gente cansa.